Desde o
primeiro suspiro que procuramos alguém em quem possamos confiar. Alguém que nos
dê a mão, que cuide de nós quando mais precisamos, que nos aqueça em dias frios
e que se disponha a oferecer-nos sorrisos mesmo quando não os sabemos devolver.
Ao longo dos anos vamos aprendendo que nem todos o farão e, acima de tudo, que
aqueles que hoje nos acompanham acabarão (quase) inevitavelmente por falhar a
dada altura. Normalmente quando mais precisamos.
Tornamo-nos mais
cautelosos e aprendemos que, afinal, não podemos confiar em toda a gente. Ou
pelo menos não podemos confiar cegamente como seria nosso desejo. Vamos criando
defesas e, lentamente, fechamo-nos no nosso castelo e não permitimos que
qualquer um o possa invadir. Vivemos de relações ilusórias. De abraços dados
através das grades, que se querem fortes para nos protegerem. Para garantir que
ninguém chegará realmente até nós. Movemo-nos em mundos paralelos que tememos
que passem a reais. Estabelecemos ligações aqui e ali, preferencialmente à
distância. Sempre a uma distância que nos permita alguma margem de manobra para
fugirmos. Para nos defendermos. Construimos e vendemos uma imagem idealizada de
nós mesmos. E, acima de tudo, esforçamo-nos para que nunca ultrapassem a tal
linha imaginária que uma vez transposta implica grandes riscos.
Nem toda
a gente consegue passar esta fronteira tão bem (?) protegida. À custa de muitos
erros vamos aprendendo alguns truques que nos ajudam a distinguir quem merece
visitar-nos. Muitos nos estendem a mão mas poucos são os que querem realmente
aliviar-nos o peso que trazemos. Por vezes passam-nos o braço pelo ombro apenas
para sentirem até onde conseguimos suportar. Outros sentam-se ao nosso lado, sem
que alguma vez estejam realmente connosco. Para a maioria somos uma espécie de
passatempo. Quando o nosso grau de exigência aumenta, ou quando a dificuldade
dos nossos problemas sobe de nível, afastam-se como crianças aborrecidas por não
conseguirem resolver um quebra-cabeças. Não é facil fazer a distinção e o
instinto, que tantas vezes nos comanda, nem sempre indica os melhores
caminhos.
Por vezes baixamos a guarda e deixamos que cheguem a este lado.
A este mundo que só nós conhecemos e que guardamos como um tesouro. Não que seja
precioso mas apenas porque é o que temos de mais nosso. As nossas memórias de
criança e os nossos sonhos de adulto. Os medos que nos assombram as noites e os
desafios que fomos ultrapassando. As lágrimas que chorámos sozinhos e os
sorrisos que fomos conquistando. As ilusões que ousámos viver e as outras que
tememos assumir. Coisas pequenas. Uns pequenos nadas que nos dão a ilusão de
sermos unicos, especiais. Ainda que apenas aos olhos daqueles a quem nos vamos
entregando. Afinal, de que vale um tesouro se não o pudermos
partilhar?
Então arriscamos confiar. Confiar implica sempre um elevado
risco. É precisamente o estar disposto a correr esse risco, quando não sabemos o
que nos espera. É estar disposto a baixar as armas, mesmo sem saber o que há do
lado de lá. É deixarmo-nos cair, mesmo sem certezas se nos vão agarrar. É fechar
os olhos e deixarmo-nos ir às cegas. É perder o (aparente) controlo sobre o que
nos rodeia e acreditar em quem nos leva pela mão no escuro, muitas vezes em
silêncio. É seguirmos um caminho sem certezas. E mesmo assim irmos. Apenas
porque sim.
...e sabe tão bem deixarmo-nos ir!
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