sexta-feira, 18 de maio de 2012

Freud entre um croissant e uma couve.

Realmente desde que deixei de ser elitista e morar em condomínios fechados junto ao mar e ao pinhal, trocando pela vida lisboeta num sítio que cada vez gosto mais, há certos prazeres que vou redescobrindo e que dão um não sei Q de qualidade de vida que irei tentar preservar. Um desses prazeres é usufruir do comércio de bairro, nomeadamente mercearias e padarias, e não é por causa do saudosismo e apego às tradições de antigamente, que fazem chorar qualquer calhau, tirando eu.
Tudo bem que os preços são elevados face às grande superfícies mas, pelo que observo regularmente, não se deve arranjar psicanalista mais barato. Bem vistas as coisas, onde é que se arranja uma boa consulta pelo preço de pão para almoço e jantar?
Entre os cumprimentos da praxe, o pedido e o acto de pagar, pode-se desabafar sobre problemas em casa, sobre a solidão, sobre a incerteza do futuro profissional e até sobre o facto da senhora do Corsa Azul andar mais arranjadinha. O merceeiro/padeiro não vai reclamar e vai fingir-se atento, pois a clientela tende a rarear nos dias que correm e boa parte dos outros fregueses vai sentir-se satisfeita por poder participar num painel clínico em que opiniões acutilantes como: “Deixe estar, vai ver que amanhã se Deus quiser já se sente melhor”, “Olhe, eu sei bem o que isso é, lá em casa é a mesma coisa” ou “Isto está cada vez pior, é viver cada dia o melhor que se pode, porque nunca se sabe o amanhã” são valorizadas ao nível dos melhores medicamentos.
Mas, apesar de apreciar sinceramente que aquela corja se despachasse e me deixasse comprar um simples croissant em menos de dois minutos, eu compreendo e encorajo esse comportamento. É que posso não ter pachorra para estes filmes, mas mais vale gastar o dinheiro em couves e vianinhas do que em psicanalistas duvidosos.


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